quinta-feira, 28 de julho de 2016

Aquela viagem

"Eu teria inúmeros motivos para descrever porque gosto tanto de viajar, mas por hoje fico com esta: Pela alegria de viver e pela falta de frescura".

Martha Medeiros - Feliz por Nada




Procurei as mais belas palavras que sincronizassem de forma harmônica e coerente para este texto. Iniciei e apaguei umas dez vezes, no minimo. Desabafei com uma amiga, que era muito difícil expor um sentimento com tal riqueza de detalhes. Tive vontade de chorar, de saudades. Gargalhei em muitos momentos, lembrando de episódios hilários. Resolvi relatar, da melhor forma possível o que essa viagem significou - de mim para mim. 

Se existe uma coisa que eu amo mais que viajar é dormir no avião. Sim, parece loucura, mas acho o máximo dormir em um estado e acordar em outro. Tipo teletransportação (nem sei se essa palavra de fato existe, mas ela encaixa perfeitamente na explicação que quero dar). Dei breves cochilos no voo. Não queria perder nenhuma oportunidade espetacular de uma vista maravilhosa que me tirasse o fôlego. O que fiz muito bem, depois de uma série de episódios catastróficos que vinha atravessando. Me surpreendi quando avistei o Rio Tocantins e ao fundo as chapadas onipotentes, fazendo daquele cenário único. Um belo presente para minha chegada rumo a desvendar as belezas comentadas do estado Tocantins. Geograficamente, Tocantis está localizado na região norte do país, estado este relativamente novo (sim, sou mais velha que o estado, acreditem!). Um estado que esconde belezas naturais indescritíveis. O destino final? Jalapão. Arrepia só de escrever o nome.

Meu primeiro pensamento foi: Porque não vim antes? Pergunta que foi respondida nos dias que se passaram. Eu só conseguia agradecer, uma gratidão que se apossou do meu ser. Era uma viagem desejada e merecida, e que aconteceu exatamente no momento que eu mais precisava. Uma viagem com uma grande amiga que também, desde quando nos conhecemos, planejamos ir juntas pro Jalapão. Aquele tipo de viagem que você tem que fazer enquanto as costas não doem e as pernas aguentam a brutalidade. Tinha que ir antes de morrer e ponto.


Mas a questão não foi só o fato de ir pra uma lugar maravilhoso com a amiga mais aventureira que você tem. Foi todo o contexto, toda a paisagem, a insanidade engraçadíssima do guia, o quinto elemento do grupo que a gente nem sabia que teria, e o namorado da amiga aventureira, que tem cara de rapaz sério mas é uma figura - e que dupla formou com o guia, hein!


Eu tinha esquecido quando realmente tinha me sentido em êxtase de tanta felicidade. Eu tinha esquecido de como era demais ficar com o pé encardido de terra vermelha que demora pra sair. Eu tinha esquecido como é maravilhoso ver o sol nascer - e se pôr. Eu tinha esquecido como é maravilhoso pular inúmeras vezes num rio e nem ligar se isso ocasionaria ou não um impacto ambiental.

E teve momento cultura, é claro! Descobri que as queimadas que ocorrem no cerrado brasileiro se dão pela seca - e curiosamente essa queimada acontece para a renovação da vegetação - e incrivelmente a minoria das queimadas se dão pelo homem. Natureza sendo sábia, como sempre. As araras azuis, lindas e voando com o maior estilo do mundo, fazendo um bando de gente urbana demais, acostumados com cachorros e gatos ficarem de boca aberta e câmeras  a postos para pegar o melhor click. As canindés (araras) também deram o ar da graça, desfilando as cores da bandeira do Brasil, mas sendo tímidas e não se expondo muito. Falando em bicho, ainda bem que azinimigas (leia-se cobras) não apareceram, para nossa alegria.

Um dia foi estupidamente melhor do que o outro. Juro que até fiquei mal acostumada com tantos pores-do-sol maravilhosos. Dá um nó na garganta. Aquele nó de você querer chorar de emoção. Lógico que a gente engole o choro, disfarça os olhos marejados com um bocejo e continua admirando o espetáculo silencioso do sol indo e da lua cheia chegando e iluminando aquele cerrado peculiar e maravilhoso. (gente do céu, a lua cheia mais linda-maravilhosa-inacreditável-espetacular que eu presenciei na minha vida foi no Jalapão!).

Os fervedouros, que não são em nada parecidos uns com os outros e são espetaculares. As cachoeiras de águas cristalinas e deliciosas, que desperta sua criança interior e você fica com medo de pular a primeira vez, mas depois, pula tanto que mal sente as pernas, ri tanto que fica com dor na barriga e engole litros de água e esquece o que é protetor solar. 

Lógico que a cultura continua. A fruta buriti ( e a gente descobre que buriti não é só um creme hidratante - ele é fruta que pode ser comida, vira doce e até sorvete) só nasce perto das veredas e é alimento de um monte de animais. E aquela variedade de frutas? Cajá, graviola, cupuaçu, caju. Eu queria tomar um suco de cada fruta, toda hora e o tempo todo.  

Terra de gente simples, simpática, bruta e sem frescura. Terra de terra vermelha e branquinha. Terra da casa do Pablo Escobar que ninguém sabia, mas que, desde já fica sabendo, pra não alegar ignorância. 

O destino? Espetacular! O nosso guia mitou do inicio ao fim, nos arrancando muitas gargalhadas e nos apresentando o paraíso ainda escondidinho (não por muito tempo) no centro do nosso Brasil. 


E ficam as amizades feitas e fortalecidas; as diversas tonalidades de verdes; o azul daquele céu  limpo e fascinante; as histórias que viram parte da nossa história pessoal e mostram quanta sorte temos; o silêncio que predominava e trouxe a quimera paz desejada.

Eu poderia ficar aqui, dias e mais dias, relatando como o Jalapão mudou a minha percepção de certas coisas na minha vida e o quanto ele me marcou. Mas nenhuma palavra seria capaz de expressar com tal riqueza de detalhes o que eu senti nos dias que lá estive.

Ficam as saudades do guia quase chorando por causa de cinquenta reais; do balanço da caminhonete nas estradas quase intransitáveis; dos pulos nos fervedouros para foto ou pura diversão, do sorvete de tapioca, murici, cajá, buriti e graviola; da paçoca que tinha no almoço e no jantar - e que nem era de amendoim - era de carne seca mesmo; naquela fome desvairada depois de andar quilômetros e quilômetros comendo poeira; das pérolas da viagem. 

Jalapão é bruto? Muito! Tem que ter muita maturidade e jogo de cintura para encarar o choque de realidade que aquele lugar proporciona. Você vai uma pessoa e volta outra (mais encardidinha também!) e é inevitável um dia sequer não agradecer tal oportunidade e as companhias. É aquele destino que a gente quer voltar sempre e sempre, até criar raízes e não sair mais de lá.






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